A Revolução de Abril contada às crianças - Jaime Gralheiro
ERA
UMA VEZ UM PAÍS…
Era
uma vez um país,
que
tinha como matriz a forma de um caixão.
Nesse
país de terror,
havia
como senhor
um
homem sem coração…
Um
tirano, um opressor!
Só
quem queria o que ele queria,
e
pensava como ele,
e
como ele, também fazia
é que
tinha a regalia…
de
ser gente… os outros não!
Tratados
como vassalos, muito pior que cavalos
Ainda
abaixo de cão!
Para
ter tudo na mão,
esse
monstro de mil olhos,
de
mil ouvidos, mil traições,
entrava
em qualquer lugar
para
ver, ouvir, escutar…
E
quer fosse no emprego,
em
casa de cada um,
no
café, na escola, ou praça…
Sempre
o olho da desgraça,
o
seguia e perseguia,
de
modo que quem dizia
mal
da sorte, ou do patrão,
altas
horas, ou de dia,
ía parar à prisão.
Meses,
anos, uma vida…
Humilhado
e torturado,
donde
só às vezes saía,
pela
única saída:
embrulhado
num lençol,
atirado
à cova,
noite
fora e em segredo!
Era
um país de “carneiros,”
sob o
chicote do medo…
Oprimidos,
censurados,
em
fila bem perfilados,
como
quem pede perdão!
Trabalhavam
como escravos,
do
nascer ao pôr do sol.
Aos
Domingos tinham missa,
à
tarde futebol…
e à
noite ouviam o fado.
Nesse
país desgraçado,
tudo
o mais era “pecado”,
mesmo
sonhar acordado!
Até
vestir “blue-jeans”, ter isqueiro,
ou
rapaz e rapariga…
sentados
numa carteira,
lado
a lado.
Tudo
isso era vedado
pela
moral do senhor
Era
tal a opressão,
era
tal a violência,
ao
longo de tantos anos…
Que,
tomando consciência
de
tantas dores, tantos danos,
as
armas que guardavam
o
monstro das mil traições,
e às
suas ordens matavam
e às
suas ordens morriam,
começaram
a conspirar…
Noite
fora…
com
aqueles que saindo das prisões,
sempre
inventaram lugares
onde
não houvesse ouvidos
do
monstro dos mil olhares…
E foi
assim, vede bem
Que
numa certa madrugada,
sem
que o esperasse ninguém,
explodiu
uma canção,
como
se fora granada!
-Quem
ousou gritar…
“O
povo é quem mais ordena?”
Quem
é a voz que acena,
fora
de horas com a revolta:
-“Aqui
Movimento das Forças Armadas”!
Quem
é que deixou à solta,
enchendo
todas as ruas,
largos,
praças e vielas,
milhares
de cravos a florir
no
cano das espingardas?
Quem
é que pôs nas varandas,
quem
é que pôs nas janelas
grandes
bandeiras vermelhas?
E um
rio de gente inundou o país,
afogou
todos os medos,
estilhaçou
as algemas.
Essa
voz assim o quis!
E a
coragem deu as mãos,
ligou
um povo de irmãos
a
cantar um canto novo,
que
se levanta e flutua,
vai
já no meio da rua,
como
chama que incendeia
a
resistente candeia…
Que
se fez multidão
pronta
a gritar:
“O
povo está com o MFA”,
“O
povo está com o MFA”…
E
levanta-se do chão…
enche
as almas oprimidas!
-
Olá!
Mas,
o monsto dos mil olhos,
como
um velho leão
acossado,
ficou cego!
Seus
mil ouvidos
Ficaram
surdos e num último estrutor,
Encurralado,
O
monstro disparou…
E
mais uma vez matou,
um
povo desarmado!
Tinha
que ser assim:
assassinos
até ao fim,
numa
revolução de fraternidade
e
amor,
cuja
arma era… apenas uma flor!
Pois,
esse país triste e desgraçado,
não é
uma fábula não! EXISTIU!
Foi o
Portugal dos vossos pais e avós!
E
agora… SOIS VÓS,
que
tem na mão o país novo,
sempre
a construir:
o
Portugal de Abril,
o Portugal do Povo,
que
há-de florir…
Em
cada geração que vier!
MAS
CUIDADO!
Que
por detrás dos escombros
desse
tal Passado,
estão
sempre os ombros
do
velho monstro,
que
renasce em cada dia
em
que a Liberdade e a Democracia
São
atacadas!
SENTINELAS
DO FUTURO TEREIS DE SER,
PARA
QUE O VELHO MONSTRO
DE MIL OLHOS, MIL OUVIDOS E MIL MÃOS
DE MIL OLHOS, MIL OUVIDOS E MIL MÃOS
Março
de 1999
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